José Henrique Pinho

TANZÂNIA

Olá a todos.

O meu nome é José Henrique Pinho, fiz o curso na FMUP e neste momento sou Interno de Formação Geral no Hospital de Bragança. Falo-vos porque me foi solicitado que partilhasse um pouco da minha experiência de voluntariado. Se vos fizesse um relato dos meus dias em missão, encontrariam um texto em tudo semelhante ao de tantas outras pessoas que, felizmente, tiveram uma experiência tão enriquecedora como a minha. Por isso, achei por bem dividir este testemunho em alguns pontos, nos quais acho importante que qualquer pessoa que se sinta disposta a partir em missão reflita um pouco.

  1. A formação

Fazer missão durante o curso sempre foi um grande objetivo meu. Entrei em medicina um pouco com intuito de me manter por perto da medicina com a vertente humanitária, por isso fazer missão durante o curso era essencial para mim, para que conseguisse perceber se o meu plano de futuro se enquadrava naquilo que a realidade tinha para oferecer.

De forma totalmente inesperada, soube em Abril de 2016 de um grupo de jovens adultos que se preparava para partir numa missão de um mês na Tanzânia, organizada pelos Missionários da Consolata. O grupo encontrava-se em formação desde de novembro do ano anterior, mas por razões de saúde, um dos membros do grupo viu-se impedido de ir. Assim, eles procuravam alguém que, em Abril, estivesse disposto em ir em missão daí a cerca de 3 meses. Com todo o meu entusiasmo, entrei em contacto com eles  e integrei um grupo que se vinha a preparar há muito tempo para aquela missão.

Se procurarem um pouco, vão-se aperceber que a maior parte das organizações de voluntariado exigem um período de formação de largos meses antes de enviarem alguém em missão – período esse que eu via assim encurtado a 3 meses de preparativos finais.

Assim,  primeira conclusão a que cheguei e que partilho convosco é: não subestimem a importância de uma boa formação. Vão viver num país totalmente desconhecido, com uma língua que não entendem, comida que vos é estranha e costumes que nem sempre compreendem. Vão estar muitos dias seguidos num ambiente que não é o vosso, por isso é essencial que o conheçam o melhor possível antes de partir. Vão viver muito num espaço de tempo muito curto e por isso é fundamental que conheçam bem o vosso grupo. O amparo que ele vos pode dar será absolutamente essencial.

2. As expectativas

Enquanto preparamos a missão, edificamos um projeto que pretendemos concretizar enquanto nos encontramos no local. Com o projeto acabamos por edificar também uma série de ideia e expectativas, que nem sempre correspondem à dinâmica local.

O nosso projeto consistia na renovação de escolas pertencentes aos missionários da Consolata, localizadas em Dar es Salaam, Iringa e Morogoro. Durante o ano angariamos fundos e material escolar, com o objetivo de os entregar nas escolas.

Conseguimos arranjar o material escolar e conseguimos também comprar o material de construção civil necessário à renovação das escolas. Então, demos início ao nosso projeto. Todos os dias, quando as crianças saíam das aulas, rodeavam-nos para que brincássemos com elas. Numa dessas brincadeiras, reparamos que um dos miúdos tinha uma folha de papel colada no tornozelo, no que parecia ser uma tentativa de penso muito rudimentar (e neste momento parece-me importante referir que todos eles andavam descalços no meio da terra, por não terem o que calçar). Aproximamo-nos dele, retiramos o papel e deparamo-nos com uma ferida completamente infetada no seu pé. Levamo-lo até o dispensário mais próximo, a ferida foi desinfetada e foi-nos dado um saco de papel com alguns comprimidos de antibiótico que lhe deveriam ser dados nos próximos dias. Assim que chegamos ao carro, o Padre local proibiu-nos de entregar os comprimidos à família da criança. Por não perceberem para que serviria o antibiótico, vende-lo-iam na feira mais próxima.

Ali estávamos nós em vias de construir uma escola nova em folha, quando as necessidades daquelas pessoas iam muito para além de qualquer parede que pudéssemos erguer. Podemos ter todo um projeto planeado, mas há sempre algo que nos surpreende e que por vezes nos faz questionar se o que deixamos é suficiente. A gestão destas expectativas é, sem dúvida importante.

3. A continuidade

Um bocadinho no seguimento do ponto anterior, haverá pouco que poderão mudar num período de um ou dois meses. Por cada problema que consigamos resolver, haverá outros 10 perante os quais somos impotentes. Por casa aspecto que conseguirmos melhor, haverá outros tantos que permanecerão inalterados e perante os quais nada poderemos fazer.

Por isso, a última ideia que quero partilhar convosco é que aquilo que a missão fará por vós será sempre muito maior que qualquer coisa que possam fazer na missão.

Que esta missão de 1 mês não seja mais que uma confirmação das vossas expectativas, um pequeno estágio numa vida de missões, sejam elas internacionais ou não.

E se qualquer um estiver na dúvida se deve arriscar uma missão ou não, arrisquem. Dar-vos-á, sem dúvida, experiências de vida que não encontrarão em mais nenhum lado.

Para o que for útil, também eu estou ao dispor

Um grande abraço e fiquem em casa

José Pinho

Josehpinho@outlook.pt