André Guimarães

ANGOLA

O meu nome é André Guimarães, tenho 24 anos e conclui o Mestrado Integrado em Medicina no ano de 2019. Sou de Esposende e atualmente encontro-me no Internato de Formação Geral no Hospital da Senhora da Oliveira, em Guimarães. Durante os meus primeiros anos de faculdade, tive o enorme prazer (e ainda maior fortúnio) de me deparar com um projeto de voluntariado universitário sediado na Universidade Católica Portuguesa – de seu nome “GAS’ África – Grupo de Ação Social em África e Portugal”.

O calendário marcava o dia 02 de Dezembro de 2014 e, acompanhado de um amigo e por intermédio de outro amigo, assistimos à sessão da apresentação daquela que, num futuro não muito distante daquele preciso momento, passaria a ser a organização que mais impacto social teria na minha vida. A proposta parecia simples – a um grupo de jovens universitários, após um processo formativo de 6 meses e angariação de fundos para suporte financeiro da missão, seria dada a oportunidade de, entre os meses de Julho e Setembro, realizarem uma missão de apoio social, com a perspetiva de impacto comunitário, em países dos PALOP ou em localidades portuguesas de maior carência. O convite feito naquela sessão para ingressar no processo formativo a decorrer doravante trouxe consigo uma grande ânsia de ingressar em algo que, pela primeira vez, sentia a colocar-me no trilho daquela que fora a razão major para, desde cedo, a Medicina ser uma convicção – a honra de se ser, estar e fazer por quem precisa.

Debruço-me ainda durante alguns períodos na componente formativa, pois, na vida de um GAS’Africano, esta tem tanto ou mais impacto que a missão por si só. De Janeiro a Junho, e sempre alicerçadas nos pilares que sustentam esta organização – Serviço, Oração, Comunidade e Simplicidade –, são semanalmente levadas a cabo formações que incidem na gestão emocional, na adaptação à comunidade de chegada, ao lado da comunidade de partida, no aprofundamento espiritual, no despojamento material e, numa fase posterior, na preparação específica da missão à qual seremos alocados.

A 29 de Julho de 2015 parti, então, em Missão e rumo ao Lubango, em Angola, ao lado de quatro pessoas que tomaram uma importância capital na minha vida. A Missão também é isto – apaixonares-te pela comunidade que te acolhe durante o dia de trabalho, e partilhares esse sentimento com comunidade que te recebe após esse mesmo dia de trabalho. Juntos, há partilha, sinceridade, confiança e entrega. E a Missão torna-se ainda mais feliz, assim.

Atendendo às necessidades, em antemão reconhecidas pelo nosso contacto local como sendo os principais pontos a focar no serviço àquela comunidade em específico, dividimos os nossos esforços para conseguir cobrir três áreas de atuação – apoio à educação, saúde e princípios básicos em gestão de negócios locais. Juntamente com outra voluntária, enfermeira de profissão, o nosso serviço consistia em dar formação a promotores de saúde locais – que não são médicos, não são enfermeiros, não são técnicos nem auxiliares. São pessoas, muitas delas aliteradas, cuja formação é feita palavra a palavra, por quem antes deles ocupavam esse cargo na sua comunidade. Para além de noções básicas de higiene, limpeza e desinfeção das mãos, do lar e do espaço de saúde, cobrimos temas como Suporte Básico de Vida, tratamento de feridas simples e queimaduras, desmistificação de mitos na saúde e maximização de recursos materiais e humanos para gestão de uma unidade de saúde.

A ideia de ir em missão é tentadora. Descobrir que nos será dada a oportunidade de ir em missão é assoberbante. Fazer Missão, vivê-la e regressar a Portugal dois meses passados é, ainda assim, mais difícil de adjetivar por uma só palavra. São os dias mais felizes e também os dias mais pesados emocionalmente. É toda a liberdade em se ser simples e todas as frustrações e murros no ar quando a realidade não o é. São todos os atos de compaixão e todas as palavras que o coração sabe falar. São todas as mãos calejadas que nos tocam e todos os espaços onde gostaríamos que as nossas mãos chegassem. São todos os cânticos, todas as formações e todos os tuapandula (que significa ‘obrigado’ em dialeto).

São certezas deitadas por terra e o reshift que isso traz. Ainda assim, uma certeza fica: que a vida pode ser o nosso Lubango e que, com mais maturidade, mas o mesmo sentido de entrega – tomando cada gesto, cada refeição e cada tuapandula como uma verdadeira dádiva -, é possível pintar os nossos pés com a mesma terra vermelha ao caminhar nos trilhos que se abrem a cada novo dia.