TIMOR
O meu nome é Mariana Maia, do 5º ano, sou do Porto e, no verão antes de entrar para a FMUP (2015), fiz um mês de voluntariado em Timor-Leste, integrando um grupo de outros colegas e colaboradores do Colégio do Rosário, onde estudei. Vou contar-vos aquela que foi uma das experiências mais enriquecedoras da minha vida e que vou, sem dúvida, repetir quando for médica.
Os meses que antecederam a missão de voluntariado foram muito importantes. Foram meses em que trabalhámos para unir um grupo que se tornou uma autêntica equipa; preparámos aquilo em íamos fazer, reunimos e enviámos material com antecedência e mentalizámo-nos que, apesar desta preparação, íamos para o outro lado do mundo enfrentar imprevistos.
O trabalho que desenvolvemos em Ossu tinha duas vertentes: o ensino e um “querido, mudei a casa” que, ao longo do mês, me foi obrigando a ter paciência, ao mesmo tempo que me orgulhava cada vez mais.
Ao final do dia, éramos convidados especiais para a Missa. Tão especiais que cantámos em tétum e ouvimos cânticos portugueses. Recebíamos sorrisos envergonhados e sentíamos o nervosismo por nos receberem num momento tão significativo. Apaixonei-me pelo povo timorense, que é de uma humildade desmedida.
Este mês em Timor foi uma descoberta que recomendo a todos. É ainda mais importante que, enquanto médicos, sejamos conscientes que partilhamos o planeta Terra com realidades que carecem da nossa intervenção para que possam evoluir em necessidades fundamentais. Educação, higiene, alimentação, bem-estar, gestão de recursos. Aquilo que podemos dar é, acreditem em mim, muito pequeno. Do nosso ponto de vista, claro. Vi lugares tão “parados no tempo” que o mínimo que ensinássemos seria um passo enorme. Mas é preciso disponibilidade daqueles a quem pretendemos dar, tempo, e muita coragem para ir. Depois de se ir a primeira vez e voltar, as malas estão feitas para um dia regressar.
Finalmente, percebi que aquele cliché do dar e receber existe, sim. E eu sei que dei muito. Mas saí de lá com a sensação de só ter recebido. Recebi, aprendi e cresci tanto. Vi, muitas noites, o céu estrelado do hemisfério sul, sentada na parte de trás de uma pick-up. Desconfortável, claro, mas a desejar estar ali mesmo. Numa dessas noites, vimos uma estrela cadente. Habituei-me a tomar banho com baldes de água fria e a não perguntar que comida estava a ser servida. Só aceitar. Ganhei a amizade de olhares desconfiados que passavam a abraços apertados. Visitei uma comunidade tão isolada (Bubur Laran) que pensei que podia aparecer na National Geographic. Fiz crianças felizes a jogar futebol e nem sei jogar. Fui “convidada” para ser irmã da Noy e tive que lhe explicar que já tinha família em Portugal. Orgulhei-me muito daqueles que fizeram missão comigo. Aprendi a contar em tétum e nunca mais me esqueci. Tive muitos lagartos no meu quarto. Mergulhei em praias desertas. Ouvi o desejo de vir um dia a Portugal. Fiz parte de uma equipa brilhante. Assisti a muita criatividade para construir brinquedos. Ofereci quase toda a roupa que levei. Trouxe pulseiras, bilhetinhos, camisolas, pedras, tais (“cachecóis” com muito significado na cultura deles) que me ofereceram. E, dias antes da nossa partida, a Professora Domingas contou-nos um provérbio que a fazia lembrar de nós: “Quem parte leva saudades, quem fica saudades tem.” E foi assim que regressei: com saudades.